Nobel de literatura: ganhou o cavalo da casa
Daniel Benevides
Uma multidão se acotovela diante de um púlpito pequeno. É nele que será anunciado, em um minuto e 43 segundos, o prêmio Nobel de literatura.
O burburinho é forte. Quem terá cruzado em primeiro a linha final? Escritor, afinal, come a alfafa que o diabo plantou. É também cavalo, como dizem as casas de aposta Ladbrokes, Unibet e outras.
Eis que uma porta alta se abre e dela surge um sujeito careca com um papel na mão. A mão dos fotógrafos, por sua vez, se agita, muitos disparam antes da hora, ansiosos demais. Desconfio que Kafka, que nunca recebeu o Nobel, teria rido de chorar da cena, um misto de pomposidade papal e certa pequenez burocrática.
Sem delongas, o sujeito lê o resultado. Lê em sueco, mas dá para entender o nome. Ganhou o favorito na casa de apostas Ladbroke. É o cavalo da casa, Tomas Tranströmer. Quem?
Procuro no ponto G, de google. Ele parece bacana. A Agulha, revista cultural de Fortaleza, tem um artigo sobre ele, de 2007. Luís Costa conta que é adorado na Suécia e foi traduzido para várias línguas. Vive isolado numa ilha, como Saramago. E teve um AVC em 1990, mas continuou a escrever e até mesmo a tocar piano, uma de suas outras atividades.
Tomas é ainda psicólogo, daqueles que vão a presídios, hospícios e casas de correção para adolescentes. A cara dele (na foto, quando jovem) é simpática.
Trecho de um de seus poemas, traduzido por Luiz Costa, em português de Portugal:
saímos.
escura da meia ilha jaz expelida sobre o mar.
multidão, somos empurrados, amigavelmente,
controlos,
fervorosos, na língua estranha.
ilha “
fortalecemo-nos, mas também por meio de
daquilo que
o outro não consegue ver. Aquela coisa
encontrar
paradoxo interior, a flor da garagem, a válvula
escuridão.
borbulha nos copos vazios. Um altifalante
silêncio.
detrás de cada passo, cresce e cresce.
escuro se consegue ler.
São imagens translúcidas que nos dão acesso à realidade, como diz a Academia. Há vários livros seus em inglês, mas arece que não foi traduzido no Brasil. Se é fato, será outra correria, outras apostas. Os cavalos dessa vez, serão os editores.